O som da televisão gritava “é final!”, mas, do lado de fora, um corpo corria por segundos antes de cair. A bicicleta tombada, a mochila de estudante e o chão misturado de cerveja e sangue e o jogo seguia, alto, indiferente.
Duas histórias na mesma noite
O atirador e a vítima estavam de bicicleta. Emerson ainda tentou correr, cambaleando, mas caiu a menos de cinco metros da calçada do bar, onde dezenas assistiam à semifinal da Libertadores.
Os disparos se misturaram ao som do narrador. O bar não silenciou. O grito de “é final!” abafou o último suspiro.
“Vida que segue”, alguém disse e o bar seguiu.
O estudante e a dívida invisível
Emerson usava o uniforme da Escola Estadual Almirante Barroso. Levava uma mochila nas costas, onde estavam cadernos e possivelmente alguns sonhos.
Mas o boletim da polícia revela outro retrato: envolvimento com facção, prisão anterior por furto, dívida pendente. Ninguém sabe o que ele devia. Só se sabe que ontem, enquanto o Flamengo comemorava, a facção cobrou em silêncio e com balas.
Quando a violência se mistura ao cotidiano
Santana aprendeu a conviver com a morte como quem convive com o barulho da cidade.
A TV continuou ligada, o som em volume alto, as conversas retomadas nas mesas. Entre risadas e goles de cerveja, o corpo esperava a perícia.
A polícia investiga, mas até o momento ninguém foi preso. O bairro amanheceu igual, como se nada tivesse acontecido.
O placar da vida
No placar da noite, o Flamengo avançou para a final. Emerson, não.
O chão secou o sangue, mas o eco daquela TV, que não se calou nem diante da morte, ainda paira no ar.
Em Santana, a vida cai, mas o jogo continua.
Comentários: